quarta-feira, 11 de junho de 2008

Sangue no Asfalto

Mataram um membro de um dos piquetes que estavam a sensibilizar os colegas para a paralisação do sector.
É simplesmente inqualificável assassinar alguém que está a exercer de forma plena a cidadania e a lutar por melhores condições para o seu sector.
Neste momento as minhas condolências vão para a família e colegas da vítima. Espero que o autor deste acto tenha uma punição exemplar.
Que a luta deste sector se alastre e fortifique e que sirva de exemplo para os restantes movimentos de contestação, são os meus votos sinceros, espero que amanhã pare tudo!

Espero também, que os por mim apelidados de “nacionais-tótós” (cujo habitat preferencial é a blogosfera) ponham a mão na consciência. O que é que são umas pedras e umas palavras mais duras comparadas com este nível de violência? Falta de respeito pelo estado de direito e pela autoridade democrática??? Tenham a santa paciência e pensem para além dos meros formalismos. Não é que as normas e convenções não tenham a sua importância, claro que sim, mas muito mais determinante é o conteúdo e substância das acções. Então perante uma ofensiva sem precedentes sobre o cidadão comum:
- destruição os serviços públicos de acesso universal;
- Subjugação do trabalho ao capital, agora com semanas de 65 horas!!! Elas já existem, eu que o diga, mas tornar isto oficial???
- Aumento geral do custo de vida;
- congelamento dos salários.
E não só isso, um primeiro ministro que chegou ao posto através da mentira descarada aos portugueses (referendo europeu??? 150 000 empregos??? Não aumentar impostos???) e que para além disso, ainda por cima é um aldrabão de primeira que tirou o curso por correspondência…

Estas políticas minam a própria democracia! Não é possível uma democracia real, se os cidadãos da Republica não têm o mínimo de protecção social, independência (alguma margem de manobra pelo menos…) face ao Patronato e ao Estado e disponibilidade de tempo para, pelo menos, se informarem acerca da causa pública. Ora, mesmo se ainda não foram feitos ataques ás instituições democráticas formais, na prática as bases da democracia, já estão a ser minadas! Voltamos ao século XIX com os seus caciques que arrebanhavam votos, como quem guia um rebanho! Claro num país de analfabetos, que iam prá praça da cidade todos os dias pedir trabalho estava-se à espera do quê???
Perante as políticas que nos arrastam para o fundo, políticas anti-democráticas que estão em directa contradição com o defendido nas eleições, vamos fazer o quê?
Sentar à espera das eleições enquanto o barco vai ao fundo?
Fazer desfiles para demonstrar a nossa insatisfação?
Escrever uma carta aos terroristas sociais que nos governam para ver se mudam de políticas?
Ou viver a cidadania de forma plena e com coragem procurar formas de impor regras e diria até medo aos que nos governam? Tentar de facto, no concreto, produzir movimentos e acções que impossibilitem o barco de ir ao fundo?

Quem é mais democrata? Aqueles que em assembleia discutem e partem para a luta para que a vontade do povo seja cumprida? Para que o prometido seja devido, ou aqueles que se lamentam, mas ficam à espera…

Já é um passo conseguir discernir as injustiças e analisar os erros, mas como diria o velho barbudo “Os filósofos só interpretaram o mundo de diferentes maneiras, do que se trata é de transformá-lo”. Panfletário? Necessariamente redutor, mas vai ao core desta discussão. E para transformá-lo é preciso muita cabeçada, basta saber de história para compreender isso.


Qual é o sentido de respeitar regras quando o adversário as viola todos os dias?
Quando todos os dias trabalhamos horas extras e o patrão não paga; quando todos os dias o nosso dinheiro vai através dos impostos para os ladrões que beneficiam das parcerias público-privadas; quando os empréstimos são perdoados aos filhos e extorquidos até ao couro aos enteados (vide BCP); quando os nossos governantes transitam dos ministérios, para os conselhos de administração das empresas a quem venderam favores e um recém-licenciado não consegue melhor do ser caixa de supermercado; quando a polícia dá bastonadas nos grevistas mas nunca vi darem essas mesmas bastonadas no patronato que todos os dias infringe as leis do trabalho, quando os nossos governantes nos mentem e nos levam para uma guerra assassina e são promovidos a rainhas de Inglaterra da Europa e eu tenho medo de aparecer na televisão numa manif porque posso sofrer represálias no trabalho…
Quando tudo isto se passa a preocupação do Nacional-tótó, muitas vezes não de forma consciente (outras sim), é atacar quem se insurge contra este estado de coisas e em vez de dar um contributo positivo e inteligente para a mudança refugia-se no intlectualmente facilitista escape de seguir as convenções: se A=B e se B=C, então A=C. Mas só fazendo uma análise completamente superficial é que se pode achar que meia dúzia (se tanto) de pedradas é igual a um assassinato, só uma análise perguiçosa pode igualar a violência quotidianamente imposta pelas classes dominantes e governos seus irmãos, a momentâneos picos de revolta e depois igualar essa revolta à repressão de que são alvo. Não, sendo ambos actos violentos, não significa o mesmo a mulher que mata o marido depois de ser espancada a vida toda mata o marido e o marido que espanca a vida toda a mulher até a matar. É a diferença entre liberdade e opressão, progresso e reacção…

Aux armes, citoyens,
Formez vos bataillons,
Marchons, marchons !
Qu'un sang impurAbreuve nos sillons !

Mai nada!
Força Para a Malta dos Piquetes!

PS – Relacionado com isto, mas noutro plano, há que pensar na imensa revolução que o nosso quotidiano e o nosso modo de produção vai ser alvo em virtude do aumento do custo da energia. De facto, todo este sector vai deixar de fazer sentido, a maneira como deslocamos os bens e mercadorias produzidos terá de ser radicalmente alterado… Mas isso não significa deixá-los há morte de um dia para o outro e têm todo o direito à revolta uma sociedade responsável o que deve fazer é em conjunto, com especial atenção para este sector que a longo prazo vai se reduzir drasticamente, procurar soluções…

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