sexta-feira, 31 de julho de 2009

Obama, Honduras e Império


Na passada terça, em Lisboa realizou-se uma concentração no Rossio contra o golpe de estado em curso. Aqui está o apelo...

Já há algum tempo que não escrevo sobre o assunto... a situação, na minha opinião, não é catastrófica, mas tb não é nada positiva... Todas as tentativas (a mais espectacular foi qd tentou chegar de avião... e estavam centenas de milhares de pessoas junto ao aeroporto para o receber) que Zelaya fez para regressar às Honduras foram bloqueadas pelos militares... Se bem que os protestos continuam, dá me ideia que com o passar do tempo mais hipóteses há de o putsh se oficializar.

O pior desfecho possível para esta situação seria a aceitação, de facto, das exigências do regime ditatorial... O congelamento do processo constituinte, o afastamento de Zelaya da vida política e o corte com as políticas sociais seguidas.
Mesmo que Zelaya regresse, de que vale a pena ele regressar se tudo o que andou a fazer vai pó caixote do lixo?
Se os responsáveis pelo golpe permanecerem nos seus postos que garantias é que isso dá há democracia (nem digo q todos tenham de ser julgados! mas removidos dos seus cargos...)? Dá a garantia que sempre que os interesses da oligarquia forem beliscados o exército será chamado para "reestabelecer" a ordem e a "democracia"(deles claro...).
Mais, uma solução desse tipo daria enorme alento a todas as elites para seguirem este tipo de métodos! Eles bem q têm tentado na Venezuela em 2002, na Bolívia o ano passado, mas até agora todas as tentativas de intimidação têm falhado... Se agora forem bem sucedido é um balde de água fria pra cima do movimento popular por toda a América Latina...

Assim sendo, uma solução à "Clinton-Obama", acaba por ser uma rectificação dos objectivos políticos do golpe... Para mais nas Honduras, muito mais que na Venezuela (e outros países com governos progressistas...), as instituições estão 100% nas mãos da oligarquia (Congresso, tribunais, exército...), numa situação destas é muito difícil avançar sem quebrar com essas próprias instituições. Enquanto na Venezuela grande parte do exército e mesmo sectores da Justiça, puderam ser usados como ponto de apoio de reformas e dissuasores de acções de sabotagem, nas Honduras o Presidente e o movimento popular estão completamente isolados...
Esta é o momento para se poder fazer uma limpeza geral nessas instituições, só assim poderá o processo prosseguir.

Não estou no terreno, nem tenho bem presente a exacta correlação de forças, logo não vou mandar bitaites sobre o tipo de métodos a usar para derrotar o golpe. Só digo que quem está no terreno deve pesar bem as alternativas e não ter pre-conceitos em relação a nenhuma. O pior que poderia acontecer em toda a América Latina seria a vitória, de facto, dos golpistas.

O governo Venezuelano está perante um desafio complicado, deverá dar todo o apoio necessário ao movimento popular hondurenho para reverter a situação. Não basta Chavez fazer discursos inflamados é preciso acção para reverter a situação e como disse, avaliando a correlação de forças no terreno, nenhuma alternativa deve ser descartada e "há muitas maneiras de esfolar um gato". Aliás, e eles têm consciência disso, nas Honduras joga-se o futuro da Revolução Bolivariana. É minha opinião, inclusivé, já de há +- um ano pa cá, que o futuro da Processo Bolivariano joga-se, neste momento, mais no palco latino-americano, do que dentro das fronteiras da Venezuela...

E o Obama? Até começou bem, mas vejam os comentários da Clinton à tentativa de regresso de Zelaya...



Para além da imagem projectada pelo topo, a verdade é que o governo dos EUA jogou um papel importante no golpe, a embaixada, os militares, a School of the Americas, etc... Basta perguntar se todas as contas nos EUA pertencentes a elementos envolvidos no golpe foram congeladas? Pois... O Império percebe que não pode usar força bruta em todos os teatros, por isso tenta de mansinho ir levando a água ao seu moinho...

Abaixo coloco a intervenção de Tariq Ali no Marxismo 2008, nela Tariq diz mt coisa... Algumas mt importantes são:
- Só há política progressista se houver pressão da base, do movimento social, nos anos 30 Roosevelt só teve força para aplicar o New Deal porque foi empurrado/apoiado pelos sindicatos e outros movimentos. Esta é uma grande diferença entre a crise de 29 e a actual, é que na altura havia uma URSS e a luta social estava em ascenso;
- Calígula foi bem diferente de Cláudio, Obama de Bush, mas todos são Imperadores e o "hábito faz o monge"...



Ao contrário do que disse para a Venezuela, o governo Obama será bem sucedido*, sobretudo, se no plano interno conseguir fazer passar algumas reformas, educação, saúde, segurança social e o "green new deal", por enquanto parece-me que estas propostas andam a circular mas ainda estão mt, mt longe de serem concretizadas...

Aliás, deixo-vos aqui uma excelente reportagem da AlJazeera (exemplo que se podem fazer notícias mainstream com rigor, seriedade e com temas de grande interesse) sobre o conflito no estado de "West Virginia", entre ambientalistas e activistas locais que querem preservar as montanhas e apostar na energia eólica e a indústria do carvão que pretende rebentar com as montanhas e sacar o combustível... é mt interessante.



O Obama na campanha em discursos até deu como mau exemplo a destruição das montanhas Apalaches! E, bem, aproveitou para falar na aposta nas energias renováveis, etc...
Na prática o governo Obama (a instituição que regula a actividade mineira) autorizou a companhia mineira a destruir as montanhas contra a vontade das comunidades e activistas... Mas, o movimento está a crescer e recentemente ocorreu a maior manifestação de sempre a propósito deste tipo de temas. A esperança dos activistas é ganhar tempo, para que o governo federal legisle contra este tipo de prática (mountain top removal) e apoie o projecto de uma "quinta eólica".
Lá está, o movimento também se galvaniza pq espera através da mobilização pressionar Obama a implementar o programa que ele próprio enunciou na campanha! É a dialéctica... Porque Obama não fará nada de substantivamente progressista se a isso não for obrigado... e nem é tanto obrigado, ele por mais que queira é um homem isolado por gabinetes, secretarias, lobistas, grupos de pressão, agências governamentais, eu sei lá... todas com uma inércia, todas (ou quase) claramente ao serviço dos interesses estabelecidos...



De qq das formas o facto de o movimento estar a crescer é positivo, espero que o mesmo comece a acontecer noutros sectores, aliás por isto mesmo é que disse que uma vitória de Obama seria mt importante... N por esperar que o Império mude de natureza apenas porque o novo Imperador é um "porreiro", mas porque a sua escolha pelo povo dá um sinal galvanizante para todo o movimento popular...
Ou seja, com ele as condições para a acção e crescimento do movimento popular são bem maiores do que se o outro fosse eleito, agora as políticas só mudaram se o movimento conseguir aproveitar o espaço e impor a sua agenda.
(pelo menos introduzir um pouco de racionalidade no processo de decisão, de forma a que não seja apenas o grande capital a ditar os seus termos, prioridades e necessidades)

*bem sucedido no sentido de não desmoralizar e desanimar completamente as pessoas que votaram nele... sim pq Bush será uma piada comparado com o q vem a seguir caso Obama claudique completamente, aliás vai ser cá uma confusão...

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