terça-feira, 12 de junho de 2007

Comentários ao Texto da Venezuela

Deixo-vos aqui, um comentário de um amigo ao txt que escrvi sobre o Processo Bolivariano, é um bom contraponto ao meu entusiasmo, quase transbordante... É bom porque acima de tudo temos de manter sempre uma grande dose de lucidez... Se bem que (e eu não poderia deixar de "virar o bico ao prego"...), infelizmente, o maior problema que temos hoje não é o de termos uma visão demasiado empolgada, emotiva do Processo... Antes pelo contrário o que agora, na alvorada do século XXI me preocupa mais é o excessivo cepticismo, cinismo e arrogância com q são encarados este tipo de fenómenos... Está na moda ser niilista... Quanto a mim não basta mandar bitaites (se bem que o bitaite e a posta de pescada são elementos fundamentais para a construção de uma nova e melhor sociedade), é muito fácil ser treinador de bancada e observar o mundo a partir de uma intocável torre de marfim... A verdade é que quem mete as mãos na merda, suja-se... é inevitável... Mas só assim se transforma o que quer que seja...


Mas bom, aqui vai uma crítica fixe!







1 - O teu texto dá uma ideia demasiado autosuficiente do processo venezuelano. Acho que teria ficado mais completo se tivesses feito um enquadramento da situação internacional. Estou convencido que o processo bolivariano só foi tão longe porque os Estados Unidos estão atolados no Iraque e portanto sem hipóteses de interferir seriamente numa região que sempre consideraram o seu "quintal". Para mim este é um ponto de partida fundamental para compreender o que se passa na Venezuela e no resto da América Latina

2 - Acho também que dás uma visão excessivamente optimista da situação. Estamos perante um processo em desenvolvimento e é preciso tentar compreender algumas das suas contradições e fragilidades. Se amanhã um golpe de direita derrubar definitivamente o Chavez será fácil para alguns dizer que tal desenlace era inevitável. Eu não acho que este tipo de atitude seja razoável precisamente por causa de muitas das virtudes do processo que tu invocas no teu texto (o compromisso de Chavez com o movimento de massas e a forma como se apoiam mutuamente). Mas é preciso ver que Chavez está à cabeça de um aparelho de estado completamente hostil à sua política (ele próprio fala dessa questão em alguma profundidade na entrevista com a Marta Harnecker ) e que mantém intactas as relações sociais burguesas. Isto não deve ser visto como uma oportunidade para denunciar o Chavez mas como uma situação realmente problemática (e perigosa) para o processo venezuelano e à qual é necessário dar resposta.

3 - A resposta passa a meu ver, pela dinâmica do movimento de massas. Se começarem a aparecer de forma autónoma orgãos de gestão de base, capazes de mobilizar pessoas independentemente do seu alinhamento partidário isto pode acelerar o processo, radicalizar ainda mais o próprio Chavez e isolar os sectores mais indecisos ligados à direcção bolivariana. Faço esta ressalva porque a dinâmica do processo tem corrido em grande parte de cima para baixo: o governo criou as Missões, o governo criou os círculos bolivarianos, o governo está a criar o novo partido. Apesar de a resposta popular ser positiva ainda está um pouco longe daquilo que é necessário para fortalecer o processo e levar a revolução a bom porto. Ou seja, a chave do sucesso da revolução está na automobilização das massas, na sua tentativa de tomar o controlo da situação. Tal mobilização poderia esvaziar de sentido e de poder alguns sectores do aparelho de estado e assim contornar a sua oposição enfraquecendo um importante ponto de apoio da oligarquia. O facto de um movimento social sólido não existir quando se iniciou o processo não é determinante, numa situação tão volátil esse movimento pode surgir de um dia para o outro. No entanto ele ainda não existe.

4 - A criação do novo partido não me parece que garanta o surgimento de tal movimento. Isto porque um partido para representar o movimento deveria ser o resultado de um processo orgânico de discussão e luta comum, ou seja, membros dos vários partidos serem confrontados com a questão da unidade para dar respostas à situação política Ao invés, o PSUV tem sido criado de cima para baixo. Foi uma decisão das cúpulas que vai pôr no mesmo partido sectores muito distintos e contraditórios. Assim a criação do novo partido pode ser uma perigosa ilusão de unidade que poderá fragmentar-se num combate sério contra a oligarquia. Para além disso, o risco de se tornar uma estrutura dominada por conflitos internos, burocrática e actuando como correia de transmissão das decisões do governo é grande.

5 - Dito isto, levantar estas questões não significa uma visão pessimista ou sectária da situação. O processo venezuelano é muito dinâmico e quem sabe, alguns destes problemas possam até ser ultrapassados muito mais rapidamente do que pensamos.

Sem comentários: