segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Nova Bolivia

A proposta de uma nova constituição foi ontem finalmente referendada e aprovada! Após um longo e turtuoso processo, incluíndo a tentativa de desmembramento do país, este é um passo decisivo para consolidar o processo de transformação social em curso.
No entanto os resultados não deixam também de dar margem de manobra à oposição Independo-Terrorista, mas é significativo que em todas as provincías, o limite máximo admissível para a propriedade fundiária tenha sido estabelecido em 5.000 hectares (o mais baixo possível).

Abaixo deixo parte (aqui podem ver o texto completo) da entrevista conduzida pelo Bruno na Venezuela ao embaixador da Bolívia. Deixem-me só dizer que quando lá estive fui a uma manif em que um dos oradores era exactamente este embaixador, pelo menos retórica inflamada não lhe faltava!

O povo boliviano obteve uma vitória no referendo de ontem. Milhões de indígenas acorreram às urnas para aprovar a nova Constituição da Bolívia e para decretar cinco mil hectares como limite máximo para as terras. Levanta-se agora a dúvida sobre como reagirá a minoria branca que dominou os destinos da maioria indígena durante séculos. É na Bolívia que o conflito está mais latente e onde a burguesia é mais violenta. Por isso, a Rádio Moscovo entrevistou o embaixador da Bolívia para tentar compreender a realidade política daquele país e deixar aos leitores uma visão que certamente não terão acesso através dos jornais portugueses. Uma entrevista que será publicada em duas partes, entre hoje e amanhã.

Quem conhece a pobreza dos barrios de Caracas sente um violento contraste ao passar em Altamira pelas mansões protegidas por seguranças privados e por redes electrificadas. Ironicamente, é aqui que se encontra a embaixada do país mais pobre da América do Sul. Mas não está só. Pelas paredes da avenida, surgem dezenas de pichagens de solidariedade com a Bolívia e com Evo Morales. E no muro da Embaixada destaca-se um mural com as várias etnias de mãos dadas.Jorge Alvarado Ribas é o embaixador da Bolívia. Foi membro da Juventude Comunista. Estudou na União Soviética e é engenheiro geólogo. Envolveu-se no MAS, foi um dos protagonistas da guerra da água e depois assumiu a direcção da Yacimientos Petroliferos Fiscales Bolivianos (YPFB). Para além disso, foi deputado nacional e candidato à presidência do departamento de Cochabamba. Sempre cordial, acedeu sem qualquer reserva a ser entrevistado pela Rádio Moscovo. Perguntando-lhe sobre como vive a nova situação boliviana, Jorge Alvarado sorri. Para ele, não há melhor momento na sua vida. Sente-se completo por viver este processo e por poder contribuir para uma nova Bolívia.

Rádio Moscovo - Gostaria de compreender por que motivo durante tanto tempo uma minoria branca dominou a política boliviana e como foi isso possível quando 80 por cento da população é indígena?

Embaixador Jorge Alvarado Ribas - Libertamo-nos do jugo espanhol em 1825. O nosso primeiro presidente foi o Libertador Simón Bolívar, que esteve cerca de seis meses no cargo. Depois, deixou-o ao Marechal António José de Sucre e este esteve no governo à volta de dois anos e três meses. E deixa o governo, justamente pelo desejo das oligarquias bolivianas de tomar o governo. Na prática, o Marechal foi expulso da Bolívia e do governo pelas oligarquias.
As medidas que estava tomando, com o Libertador Simón Bolívar, eram, fundamentalmente, para favorecer os indígenas da Bolívia. Por exemplo, os primeiros decretos do Libertador foram a favor dos povos indígenas. Um deles promovia a distribuição da terra aos indígenas. Estabelecia que se devia distribuir terras a todos “sem que fique um só indígena sem terra” e estabelecia uma extensão determinada de terra a distribuir para as zonas onde havia água para a rega e o dobro da extensão para onde não havia água. Contudo, o mais importante desse decreto, que não podia ficar um único indigena sem terra, nunca foi cumprido.
Outro decreto importante daquele tempo é o que estabelece que a todos os trabalhadores do campo e da cidade se deve pagar em moeda pelo seu trabalho e não em espécie. E porque emitiu esse decreto? Porque os latifundiários escravizavam os indígenas. Os donos das terras também eram donos de vidas. E esse estado de escravidão tinha a ver com o pagamento do o trabalho em espécie e não em dinheiro. Esse decreto tão pouco se cumpriu. Inclusive, essas condições existem agora na Bolívia e foram denunciadas pela Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas há um par de meses. Na zona Oriental da Bolívia, principalmente no Chaco, mantêm os indígenas em condições de escravidão e uma das formas de os manter assim é através do pagamento em espécie. Como fazem os latifundiários? Pelo trabalho do indígena pagam com roupa e com comida que o indígena vai buscar ao armazém do dono da terra. Acaba por ficar endividado de forma permanente, nunca poderá pagar essa dívida e o patrão tem-no subjugado na sua propriedade.
Desde a época em que os oligarcas e os latifundiários expulsaram Sucre, estes dirigem o Estado porque quem tem o poder económico tem o poder político. As minas, as terras, os meios de produção estão nas mãos destas oligarquias e elas tiveram o controlo da vida política em toda a história republicana.

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