"(…)a UE poderia ser já hoje, com reformas institucionais adequadas, o espaço privilegiado para pôr em prática políticas keynesianas coordenadas de relançamento económico e de regulação da finança, de harmonização fiscal e de convergência em termos de direitos sociais."
In Ladrões de Bicicletas
Uma coisa é certa, o espaço Europeu tem massa crítica capaz de sustentar um projecto sério de salvação do estado de bem estar social e de promoção de mais justas e solidárias relações internacionais (sejam elas, políticas, económicas ou sociais). Mais, hoje em dia ou um projecto dessa natureza é pensado à escala europeia ou é inviável à partida…
Mas a verdade é que já estive mais confiante na tese acima exposta. Porquê? Por tudo o que implica efectuar as “reformas institucionais adequadas”…
No chamado “processo de construção Europeia”, a edificação de um verdadeiro sujeito político sempre foi o acessório, a defesa de um modelo social solidário face ao ultra-liberalismo Norte-Americano não passa de retórica em flagrante contradição com as políticas adoptadas, desde o controle do défice até às novas legislações laborais. Uma suposta diferente postura no mundo, por oposição à agressividade dos EUA, é na verdade muito mais complementar ao Império sedeado em Washington do que, para dizer o mínimo exigível, alternativa.
Vivemos sob uma União Europeia, sob uma super-estrutura, que toma decisões que afectam de forma decisiva o nosso quotidiano, mas em que o cidadão não é tido nem achado. De facto, é a máquina perfeita para os governos nacionais externelizarem os custos políticos das medidas draconianas que tomam a favor do Capital. Que jeito dá um déficite de 3% para cumprir quando se quer privatizar os sectores do estado e impor cortes nos direitos sócias… É perfeito, os governos tomam as decisões no Conselho, depois vêem para os respectivos países dizer q tem de ser, são as regras da distante Europa…
Uma União Europeia que se apresente, que tenha a confiança dos cidadãos europeus, como defendido acima na citação, tem de ser democrática, com um parlamento e senado que legisle e nomeie um órgão executivo. Não esta entidade sombria intitulada Comissão, que decide e prepara a nossa vida e em nome de quem??? Mas quem é a Comissão??? Quem a nomeou para governar a nossa vida???
Uma União Europeia solidária deve estabelecer um salário mínimo europeu, direitos sociais mínimos e promover uma real mobilidade do trabalho dentro da União. Deve, no plano económico, coordenar a política de transportes e energia.
Uma União Europeia que exporte o seu modelo social só é possível se no palco internacional tiver uma voz, se não única, pelo menos coordenada e independente dos EUA…
Bem, tudo isto é o oposto do que existe actualmente, a partir daqui fazer as ditas “reformas institucionais” é uma tarefa digna de Hércules… Seguindo os actuais formalismos só com uma larga maioria de governos social-democratas honestos (e hoje em dia os exemplos que temos desse tipo de governos só existem na América-Latina) é que tal seria possível… Na verdade as “reformas institucionais adequadas” são de uma profunda radicalidade e de autêntica subversão do status quo existente. É herdar alguma da retórica do actual processo e construir algo, na sua essência, novo e oposto ao existente.
Para ser honesto, não me parece muito provável, que agora ou num futuro próximo a partir das actuais regras do jogo se consiga fazer um “upgrade” das instituições europeias e pô-las a funcionar de forma mais democrática, Keynesiana e independente… Como é que tal aconteceria? Como? Se existissem 20 Miguéis Portas à frente de 27 dos 20 países da UE actual talvez… Acham que antes disso “quem de direito” não iria bloquear este processo?
Muito mais provavelmente um governo que defendesse o tipo de União Europeia acima descrita seria expulso da União actual, pelo menos ficaria isolado, do que contagiaria os outros, mas que crise e abalo tremendo isso seria, que bela oportunidade para por o jogo às claras em cima da mesa…
Voltando ao início, independentemente da União Europeia realmente existente, que também tem aspectos muito positivos ( e basta pensar na catrefada de directivas europeias em defesa do meio ambiente que tivemos de adoptar e nunca o faríamos se não fosse a UE a impor…), qualquer projecto emancipatório viável tem de ser construído no espaço europeu e não apenas no reduto nacional, e qualquer projecto de união europeia ou será socialista e democrático, ou numa questão de tempo, será ainda mais totalitário que hoje em dia (a hipótese da implosão também não me parece do reino da ficção...).
Agora põe-se a questão de como é que se processará a implementação desse projecto emancipatório? Será possível sem uma grave crise das actuais instituições e eliminação de muitas delas? Será preciso que um ou um grupo de estados avancem sem os outros? Não é provável que no decorrer desta história alguns estados queiram, ou cheguem mesmo a romper com a União? Uma coisa é certa, vai dar muita confusão e alguns “estalos” por isso mesmo é fundamental:
- Ter um projecto simples mas com ideias chaves muito fortes, no campo da Democracia, do Económico-Social e de política internacional;
- Ter um sujeito político que dê corpo e força a esse projecto em todos os países da actual UE.
Bem talvez não esteja, no final de contas, menos confiante, mas mais consciente dos desafios que construir uma outra UE acarreta…
quinta-feira, 15 de novembro de 2007
UE, Quo Vadis?
Posted by Francisco at 02:03
Labels: Análise Geral, Europa
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1 comentário:
Acho que o problema central tem sido o medo dos governos nacionais de perderem poder na construção europeia. Enquanto puderem controlar a comissão, estão descansados.
Porque raio é que não é o parlamento europeu a eleger a Comissão?
Também já notei uma coisa engraçada ao contrário, que é o parlamento europeu fazer legislação (e ainda bem!) mais arrojada que os parlamentos nacionais. Quando digo arrojada, penso em progressista, até utópica. Acho que isto acontece por um lado por estar mais longe das merdinhas do dia-a-dia das politiquices locais (o que pode ser bom e mau) e não terem que se preocupar tanto com os problemas que advem do que eles decidem, mas também por terem uma visão mais global e não estarem presos a estratégias eleitorais locais.
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