quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

O Caminho, que já se faz tarde

À esquerda é urgente trilhar um caminho consequente, que passa fundamentalmente por dois pontos:

1º Uma postura, acção e proposta radical e sem vergonha, que ao mesmo tempo seja inteligente, criativa e livre de alguns símbolos e preconceitos do passado que hoje em dia não são mais do que lastro que atrasa a "luta";

2º Um projecto de "Salvação da República" que polarize o campo político-social à esquerda da actual direcção do PS que integrando PC, BE e "ala esquerda" do PS, transcenda esses sectores e que tenha como objectivo claro ganhar o apoio da maioria da população.

Isto tem de ser mais bem explicado, é certo, e lá irei a seu tempo, mas de forma sucinta estes dois eixos são incontornáveis para quem queira, de facto, se constituir como alternativa à cavalgada Neo-Liberal.
Deixo abaixo um bom exemplo e uma perplexidade depois comentada...


Porque é que da parte da direcção do BE ainda não vi nada dito acerca da proposta que o Alegre mandou???

Se bem me lembro uma das propostas que o Bloco teve logo na sua origem foi a de promover uma "mesa redonda de todas as esquerdas"...
Se o momento não era, há sete ou oito anos o mais adequado, agora é um passo imprescindível. Se não temos capacidade e peso para lançar esta convocatória sozinhos, aproveitemos esta boleia.
Se falta vontade à direcção do BE de convocar uma reunião desta espécie, ou se lhe faz "confusão" ir a reboque de uma personagem do tipo Alegre, então que se deixe de birras, porque o momento é tal que a nós é nos exigido muito mais do que boas propostas para esta ou aquela área e bons sound bites no parlamento.
A nós é nos exigido a definição de um caminho de saída da crise e superação do actual regime, e quem pensa que o Bloco sozinho pode fazer isso não está a ler a realidade. O PC não irá desaparecer (até se tem reforçado) e os descontentes com actual direcção do PS (vulgo Sócrates) já tem uma alternativa muito mais natural que a transição para o BE, portanto a manter-se o actual cenário a alternativa é entre a marginalidade ou sermos muleta do PS.

Sem a definição de uma estratégia clara, sem romper o cerco do rotativismo ao centro não nos safamos, nem se safa o povo. E na pior das hipóteses que ónus da derrota não seja da nossa responsabilidade, não seja por não nos termos esforçado nesse sentido. Mas não sejamos catastrofistas, ainda há tempo para dar um ganda golpe antes de 2009 e o primeiro passo é ter vontade para dá-lo!!!


quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

FIDEL

Fidel abandonou ontem, formalmente, o poder, é neste momento muito fácil apontar o dedo aos erros e traições, lembrar a carta de despedida escrita e depois lida ao Che, ou repetir pela enésima vez em como é abafada a liberdade de expressão e associação na ilha do Caribe… Mas debrucemo-nos mais atentamente sobre o legado desta personagem “bigger then life”.

Durante 50 anos liderou uma revolução que a poucas milhas do Império manteve a sua independência, a Revolução Cubana sobreviveu a invasões, atentados, sabotagem económica. Fidel, ele mesmo, foi vítima de inúmeras tentativas de assassinato. A sobrevivência teve um preço, o controle apertado das liberdades políticas, mas apesar de todas as contrariedades Cuba goza hoje de um sistema de saúde invejável, o analfabetismo foi eliminado e é o país do mundo que mais assistência internacional presta. Existem milhares de Médicos e professores cubanos espalhados pelos mais recônditos cantos do planeta a prestarem ajuda aos que mais precisam. A Revolução Cubana foi uma referência importantíssima no combate anti-imperialista, sobretudo na América-Latina, mas não só, para além da ajuda humanitária, as intervenções militares efectuadas por Cuba em Africa, nomeadamente em Angola, foram factor decisivo na derrota do Apartheid. Abaixo não resisto citar um excelente texto de Claudio Katz:

The fall of the Soviet Union provoked an international crisis of credibility for the socialist project that has conditioned action on the left. Latin America was no exception to this effect, but some theorists exaggerate its repercussions and tend to suppose that it would rule out prospects for socialism for a long period. This view has given rise to the categorical distinction between a revolutionary period (until 1989) and a conservative one (from that date on).
This separation overlooks the fact that the Latin American left had distanced itself from the Soviet model before the collapse of the “socialist camp.” The disenchantment of the 1990s corresponded more to the inheritance left by the dictatorships, to the failure of the Sandinistas, and to the blocking of the Central American insurgency. In this dimension, the survival of the Cuban revolution constituted a significant counterbalance.

Portanto, não me juntarei ao coro dos tribunais, é certo que Cuba não é o paraíso na terra, mas não deixa de ser espantoso o formidável contributo positivo que um tão pequeno país conseguiu produzir. Quanto à questão das liberdades, sem dúvida que há neste domínio uma grave falha, aliás a sobrevivência da revolução depende da sua capacidade de, neste momento, transferir poder que está concentrado nas mãos da Burocracia para as mãos do povo. Contudo, no momento das odes à liberdade enquanto entidade abstracta, foquemo-nos um pouco no concreto, pergunto, o povo com das mais altas taxas de divórcio, com acesso universal à saúde e educação será menos livre de tomar decisões e fazer escolhas que um pobre em qualquer outro país da América-Latina, ou mesmo do mundo?

Veremos se a História sempre o absolverá, como o passado é recordado em função do presente a absolvição está em disputa, o regime precisa de um abanão é certo, resta saber o que pesará mais, se o legado da Revolução ou a miragem de Miami…